É consenso que a Ciência e a Tecnologia devem estar a serviço do homem. Mas que homem? Apenas o que pode pagar por elas? Ou aquele que está ativamente envolvido na produção das grandes inovações produzidas nas instituições de pesquisas? Todo Homem deve ter acesso a uma bagagem de conhecimento suficiente para poder usufruir não só do produto final, mas compreender o processo de produção de determinadas tecnologias e, se possível dele participar, direta – atuando, construindo, criando – ou indiretamente – dando idéias do que julga necessário desenvolver em relação a alguma área específica –, conforme as necessidades que a vida diária e o ambiente impõem.
Ciência e tecnologia devem objetivar o
desenvolvimento humano, propiciando melhorias na qualidade de vida das pessoas, em todos os seus aspectos: educação alimentação, saúde, condições de trabalho, moradia. Isso deve vir atrelado ao
desenvolvimento sustentável, que, d
e acordo com o Relatório Brundtland de 1987, é o “desenvolvimento que atende as necessidades do presente sem prejudicar a capacidade das futuras gerações de atender as suas próprias necessidades”.
Diariamente, e, na maioria das vezes, inconscientemente, as pessoas estão sendo beneficiadas pelo que já se produziu em termos de ciência e tecnologia. O sistema de captação e purificação da água, a energia elétrica que chega às casas, o sistema de saneamento básico, as técnicas de esterilização de materiais e tantas outras aplicações do conhecimento científico que impactam de forma positiva a vida do cidadão comum. Não há dúvida de que o conhecimento científico tem tido um inestimável papel na prevenção e na cura de inúmeras doenças, aumentando consideravelmente a expectativa de vida que, no Brasil, cresceu 9,1 anos entre 1980 e 2004, segundo dados do IBGE. Esse crescimento é atribuído à relativa melhoria no acesso da população aos serviços de saúde, campanhas nacionais de vacinação, aumento do nível de escolaridade da população, entre outros. A aplicação de novas tecnologias no controle de pragas nas plantações favorece colheitas abundantes para atender à demanda populacional, e a produção de alimentos com isso, pôde ser ampliada. A tecnologia incrementou a capacidade de comunicar, de produzir, de tratar e trocar informações, interligando mesmo os locais mais remotos.
No entanto, se por um lado temos a mais alta tecnologia como a nanotecnologia, por exemplo, e suas infinitas aplicações nas diversas áreas como a medicina, eletrônica, ciência da computação, física, e engenharia dos materiais, por outro lado, ainda há pessoas morrendo de malária, de tuberculose, e de outras doenças que poderiam ser evitadas caso o acesso à tecnologia fosse assegurado a todo cidadão. Enquanto aumentam-se os “gigas” de computadores, e um número infinito de dados cabe em um aparato de 50 gramas ou menos, milhões de pessoas não tem acesso a bens imprescindíveis para manutenção de sua vida, como a água potável.
Isso mostra de modo convincente que o fantástico potencial de transformação da realidade gerado pela ciência pode ser utilizado nas mais diversas e contraditórias direções. Mas, nos tempos da globalização, a desigualdade no acesso à ciência e tecnologia entre os países desenvolvidos e os demais países persiste aumentando, assim como se amplia a desigualdade na sua riqueza e na capacidade produtiva. Para
Roberto Nicolsky, a questão mais crucial para um país emergente que quer alcançar um nível de produção e renda compatíveis com as necessidades da sociedade, diz respeito a quais seriam os processos, e os seus desafios, para gerar valor econômico a partir do conhecimento. Isso nos remete à frase “
Scientia potentia est, famoso aforismo do cientista e pensador Francis Bacon (1561-1626), a qual serve de argumento à demonstração de que o conhecimento deve estar livremente disponível para o benefício da comunidade mundial e, não ser escondido ou manipulado para privilegiar minorias.
Há que se “universalizar” o acesso aos bens produzidos pela ciência e tecnologia, cujo fim deve ser promover o bem-estar social do cidadão atrelado à manutenção e conservação do meio ambiente. Neste, estão compreendidos clima, iluminação, emissão de substâncias e gases tóxicos, condições de alimentação, modo de vida em sociedade, relações entre os seres vivos, etc. Todos esses fatores, interligados, podem ser negativa ou positivamente afetados a depender dos usos e propósitos da ciência e da tecnologia. Assim, a disponibilidade de informação científica e tecnológica, inclusive sobre seus riscos ambientais, e o acesso à tecnologia ambientalmente saudável e sua transferência, são requisitos essenciais para o desenvolvimento sustentável.
O desafio que se impõe aos pesquisadores e ao poder público é, portanto, criar estratégias de promoção da apropriação social da ciência e da tecnologia pelos cidadãos, independentemente de sua origem, raça ou condição social. A tecnologia deve chegar ao campo, à favela, à periferia, aos recônditos esquecidos do Brasil para devolver a sua gente a dignidade, o direito de ser produtivo, e de usufruir dos bens produzidos nos laboratórios de grandes universidades e institutos de pesquisas, cujos gastos são custeados voluntaria ou involuntariamente, com o pagamento de impostos tanto de pobres como de ricos. Assim, ela funcionaria também como instrumento de inclusão social ao apoiar a criação de arranjos produtivos locais, adaptada às condições econômicas e ambientais.
Devem-se tomar medidas de popularização dos conhecimentos científicos e tecnológicos e garantir o acesso do cidadão a estes, por meio de experiências de educação informal e não formal. No contexto atual de um mundo globalizado onde o conhecimento é poder, os países que não contemplam políticas de desenvolvimento científico e tecnológico em seus projetos de governo, submetem o país a uma dependência externa permanente, com a conseqüente deterioração dos indicadores sócio-econômicos e ambientais, que finalmente resultam nos baixos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH).
Cabe destacar, neste contexto, a grande responsabilidade da sociedade organizada e suas representações, tais como institutos, associações, universidades, organizações não governamentais (ONGs), tanto nacionais como internacionais, de criar mecanismos que resultem em ações efetivas para produção e aplicação do conhecimento. Ressalta-se também, a tarefa mediadora dos grandes meios de comunicação (Jornais, TV, Internet, Revistas), de interpretar, “traduzir” e divulgar o impacto da ciência no desenvolvimento nacional e, conseqüentemente, na qualidade de vida da nação.
documento intitulado Nosso Futuro Comum, publicado em 1987, elaborado pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas.